“NAUSICAÄ DO VALE DO VENTO” [1984]: ENSAIO DE UMA ANÁLISE POÉTICA por Thereza Cristina de Oliveira e Silva


Os animes se estabeleceram no Japão como arte comercial de sucesso durante a década de 1960, inicialmente no meio televisivo e depois também nos cinemas [NAPIER, 2005].  Durante os anos 1980, o consumo de animações já estava consolidado no país e foi nesse período que diversos realizadores puderam montar seus próprios estúdios [ODELL; LE BLANC, 2013]. Hayao Miyazaki é provavelmente a referência mais popular da contemporaneidade quando se fala em animação japonesa e é um dos fundadores do aclamado Studio Ghibli. Desde 1979, dirigiu 11 longas-metragens, vencedores de um total de 141 prêmios, sendo 79 deles referentes à categoria Direção, inclusive um Oscar e um Urso de Ouro [IMDb, s.d.]. Suas obras mais conhecidas no Ocidente são “Meu amigo Totoro” [1988] e “A viagem de Chihiro” [2001] e algumas das características notáveis de seus trabalhos são as protagonistas femininas, o gosto por veículos e personagens voando e histórias não baseadas em dualismo maniqueísta [NOVIELLI, 2018].

 

É relevante observar que durante a década de 1970 uma onda de movimentos feministas se fez presente no Japão, questionando a noção amplamente difundida de que cabia às mulheres apenas o papel de esposas e mães, cuja função era administrar o lar e garantir que os filhos tivessem sucesso escolar e, posteriormente, na carreira. O aumento no ativismo de diferentes comunidades e as demandas por oportunidades igualitárias de emprego foi tão significativo naquele período que em 1985 foi estabelecida a Lei de Igualdade de Oportunidades de Emprego, momento em que também houve a emergência da primeira líder mulher do Partido Social Democrático, Takako Doi, o principal partido de oposição do país. Destaca-se também que em 1989 22 mulheres foram eleitas para a Câmara dos Conselheiros que integra a Dieta do Japão, o parlamento do país, um número tão relevante em relação às 10 ou menos mulheres eleitas nas eleições anteriores que tal evento foi nomeado pela mídia da ocasião de "fenômeno Madonna" [TIPTON, 2008].

 

Em uma conjuntura politicamente agitada e de importante crescimento econômico do país, Miyazaki transformou seu mangá “Nausicaä do Vale do Vento” [19982 – 1994] no filme homônimo em 1984. O sucesso comercial e de público do longa-metragem foi tamanho que viabilizou a fundação do Studio Ghibli em 1985. Desde seu lançamento o anime foi chancelado pela WWF, uma das maiores ONGs do mundo para a conservação de espécies ameaçadas de extinção, e o logotipo da WWF aparecia [e ainda aparece] em tela cheia imediatamente antes do início do filme. Tal chancela, junto com as ações de divulgação que foram desenvolvidas através dela [AKIMOTO, 2014], possivelmente favoreceu o alcance tanto nacional quanto internacional do longa e um certo olhar sobre seu conteúdo, que foi endossado pelo diretor e pelo estúdio. No entanto, por mais que a leitura ambiental seja cabível, gostaria de explorar aqui outras possibilidades interpretativas.

 

Filmes são representações que têm efeitos reais sobre o mundo e trazem junto consigo visões sobre relações sociais e culturais [SHOHAT; STAM, 2006]. Considerando o momento histórico de produção de “Nausicä”, parece-me que ver o anime apenas pelo viés ambiental ou pacifista relega ao segundo plano reflexões que as próprias imagens do longa pedem [MITCHEL, 2015], a saber: o fato da personagem principal ser uma mulher jovem que está disposta a dar a vida em prol de outros. Assim, quero sugerir que o impacto produzido por “Nausicaä” não está tanto na discussão ambiental que ele pode suscitar, mas na disposição da personagem principal ao sacrifício e na maneira como isso é construído imageticamente. Tendo em vista que é papel do criador/diretor elaborar estratégias pelas quais se torna possível produzir determinados efeitos sobre os espectadores, será realizada a análise fílmica de “Nausicaä” a partir desses efeitos, investigando que recursos foram empregados e como foram utilizados com o fito de produzir certo tipo de experiência [GOMES, 2004]. Desde essa perspectiva, não me parece que se nos emocionamos com o desfecho do filme em questão seja porque a personagem principal, Nausicaä, atuou de modo ecológico e restabeleceu a harmonia entre as diferentes formas de vida, mas porque ela sobrevive – ainda que se sacrifique.

 

O filme e a sequência

Com o objetivo de refletir a respeito de como alguns personagens são apresentados ao espectador [SHOHAT; STAM, 2006] escolheu-se um segmento de 13 segundos composto por seis planos que se inicia em 1h 40min 56s. Nele, Nausicaä enfrenta seus oponentes desarmada e de braços abertos depois de se esquivar de uma série de tiros. Esse trecho faz parte dos 20 minutos finais do filme em que a narrativa se encaminha para o desfecho e é o primeiro momento em que a personagem deixa claro que está disposta a se sacrificar para salvar a vida de outros. Antes de proceder às análises específicas, será feita uma breve apresentação do enredo do filme. Cabe pontuar que a narrativa é uma saga épica e algumas passagens são contadas tão rapidamente que dificultam a compreensão do anime quando visto pela primeira vez.

 

A história de “Nausicaä” decorre de a população de um povoado denominado Pejite decidir reviver um Guerreiro Gigante, humanoide com poder de destruição em massa que atuou no evento que é sumariamente mencionado [mas não explicado] como Sete Dias de Fogo e que levou ao fim da civilização industrial 1000 anos antes. Os Guerreiros Gigantes pereceram naquela ocasião, com exceção de um, que está adormecido em forma de embrião sob Pejite, cuja liderança quer revivê-lo para tentar combater e destruir o Mar Podre, uma floresta que exala toxinas nocivas para os humanos. Ao saber disso, a base militar de Torumekia tenta roubar o embrião do Gigante e, no processo, sua nave cai sobre o bucólico Vale do Vento. Por um lado, a população de Pejite tenta se livrar dos soldados de Torumekia e reaver o Gigante; por outro, os soldados de Torumekia subjugam a população do Vale do Vento e usam essa localidade para reviver e usar o Guerreiro Gigante a seu favor. De modo complementar, tanto Pejite quanto Torumekia têm intenção de destruir o Mar Podre, o que serve como pretexto para ambos retomarem a referida arma de destruição em massa. Nausicaä, líder do Vale do Vento, é a personagem que faz frente a tais iniciativas e tem o objetivo de salvar o Mar Podre, o Vale do Vento e seus habitantes [sejam eles humanos ou não]. Cabe explicar que o Mar Podre é habitado por insetos gigantes, dentre os quais se destacam os ohmus, artrópodes de enormes proporções que têm grande potencial destrutivo quando são irritados.

 

Passemos, pois, à descrição da narrativa em que se insere a sequência selecionada. Com o objetivo de retomar o Guerreiro Gigante, Pejite captura um bebê ohmu do Mar Podre e o machuca, transpassando-o com diversos objetos perfurantes. A intenção é provocar a ira dos ohmus, que farão um ataque na direção de onde o pequeno estiver e destruirão tudo que estiver pela frente. O bebê é, então, prendido a um veículo voador e está sendo levado até o Vale do Vento. Ao se inteirar desse plano, Nausicaä intercepta tal veículo para tentar recuperar o bebê ohmu, devolvê-lo ao Mar Podre e impedir a destruição do Vale. No segmento, Nausicaä está desarmada, voando com seu planador enquanto os dois homens de Pejite que transportam o ohmu ferido tentam abatê-la com tiros. 

 

A fim de facilitar a apresentação e subsequente análise foi elaborada a Figura 1 contendo um frame de cada um dos seis planos com a descrição da ação e do áudio. Os planos acontecem de modo consecutivo, não havendo a omissão de nenhum plano do trecho selecionado. Deste ponto em diante, cada plano específico será referenciado pela letra P e seu número correspondente [P1, P2, P3, P4, P5 e P6] e será empregada a nomenclatura take, para evitar confusões entre os takes [planos] e o que está no primeiro, segundo ou terceiro plano de cada quadro. Quanto à edição, não há emprego de efeitos de transição nos cortes. Todos os takes têm a câmera fixa e são ocupados por personagens masculinos ou Nausicaä, que leva sobre o ombro direito Teto, um esquilo-raposa que a acompanha desde o início do filme. Os personagens masculinos não têm nome e foram aqui denominados de Homem de Pejite 1 e Homem de Pejite 2.

 

Em P1 vemos em primeiro plano uma metralhadora, empunhada pelo Homem 1; os dois homens em segundo plano com expressão facial séria, seus corpos e olhares voltados para a lateral direita do frame; e em terceiro plano vemos o céu e parte da parede interna do veículo voador. Em P2, as costas do Homem 1 estão em primeiro plano, voltadas para a lateral direita do frame; em segundo plano vemos a metralhadora; e no terceiro plano vemos parte da parede interna do veículo voador e Nausicaä voando no céu em seu planador – ela tem o tronco curvado para frente e braços estendidos para segurar nas hastes do planador. Em P3 a metralhadora está novamente em primeiro plano, apontada diretamente para o espectador; em segundo plano o Homem 1 olha de frente para o espectador e reage com expressão de surpresa; no terceiro plano vê-se detalhes dos mecanismos na parede do veículo voador e o céu. Em P4 vemos Nausicaä de corpo inteiro em segundo plano, de frente, olhando para o espectador em pé sobre o planador com os braços abertos, com Teto sobre seu ombro direito; no terceiro plano vê-se o céu. Em P5 o primeiro plano é ocupado pela mira da metralhadora fora de foco; no segundo plano vê-se o Homem 1 com expressão de surpresa olhando para o espectador; e o céu em terceiro plano. O segundo plano de P6 é ocupado por Nausicaä com os braços abertos olhando para o espectador, sua expressão facial é séria e serena; e no terceiro plano vê-se o céu. A sequência P3, P4, P5 e P6 faz com entendamos que Homem 1 e Nausicaä estão se olhando e um reagindo ao outro:

 

Fonte: Autoria própria, com frames do filme “Nausicaä do Vale do Vento” [1984], dirigido por Hayao Miyazaki e produzido por Isao Takahata [2022].

Quanto ao áudio, em P1, P2 e P3 escuta-se um discreto som de motor funcionando, em P1 o Homem 2 dá orientações para o Homem 1: “Lá vem ela. Deixe-a chegar perto e atire”, e ao final de P3 ouve-se um som de inspiração forte, sugerindo espanto. Em P4 entra em fade in uma música que continua até P6 e em P5 escutamos a voz do Homem 1 emitindo sons curtos que sugerem surpresa e confusão.

 

Como se pode observar na Figura 1, a maior parte dos takes é ocupada pelos personagens masculinos e eles são enquadrados mais próximos da câmera. No entanto, o fato de os homens não terem nome, junto com as composições cênicas e o emprego da música atuam em conjunto para produzir [ou reiterar] a identificação do espectador com Nausicaä. Analisemos, pois, as imagens e o uso dos recursos sonoros desde essa perspectiva.

 

Em P1, a câmera está posicionada horizontalmente em relação aos homens, cujos rostos ocupam menos de 1/8 do frame nos quadrantes superiores direito e esquerdo. Em primeiro plano, tomando mais de ¼ da imagem, vemos a metralhadora cobrindo parte do tronco do Homem 2. O áudio é discreto, indicando que o motor do veículo está ligado e funcionando. Em P2, a câmera está levemente inclinada para cima, as costas do Homem 1 ocupam quase toda a metade esquerda do frame, o centro da imagem é a metralhadora e o foco da atenção é convocado pelo movimento que Nausicaä faz no terceiro plano. O áudio mantém-se o mesmo de P1. Em P3, câmera novamente horizontal, o Homem 1 está centralizado, ocupando a maior parte do frame, e a construção imagética indica que ao apontar a metralhadora para Nausicaä, o Homem 1 está também apontando a arma para o espectador – assim, ao atirar na personagem, ele estará também atirando na plateia. O áudio mantém-se o mesmo de P1 e P2. Em P4, câmera levemente inclinada para cima, é o take em que vemos Nausicaä no centro do quadro, de corpo inteiro sobre o planador – sua imagem indica que ela não porta armas visíveis, que ela não está pilotando o planador e que ela não tem como se defender caso atirem nela. Neste take, a música entra em fade in, favorecendo a identificação com a personagem que, embora incapaz de se defender neste momento, não há nada em sua postura que indique que ela se sinta indefesa. A maior parte do take é ocupada pelo planador, que fornece sustentação à personagem, mesmo que no ar. Em P5, câmera novamente na horizontal, a metralhadora e sua mira estão fora de foco no primeiro plano e, através da mira, vemos o rosto do Homem 1 que, além de ter os olhos arregalados e brilhantes, tem um pouco de cabelo para fora da balaclava, sugerindo desalinho. Este é o único take dos homens em que não vemos no terceiro plano a parede interna do veículo voador. A expressão facial de confusão do Homem 1 é reiterada pela composição da imagem, que indicam que ele está subjetivamente sem chão ou apoio. No áudio, a música de P4 se mantém e é acompanhada dos sons curtos emitidos pelo personagem, que sugerem surpresa e indecisão. Em P6, câmera horizontal, a metade superior do take é ocupada pelos braços, peito e rosto de Nausicaä. Na metade inferior, veem-se as hastes e uma alça do planador, mas, se assim como o Homem 1, Nausicaä também está sem chão, sua expressão facial e postura indicam que ela está decidida. A respeito de Teto, o esquilo-raposa que está no ombro da personagem, é possível hipotetizar que ele é estrategicamente colocado como uma versão mais amigável do mundo animal que no filme é composto majoritariamente por insetos, os quais podem suscitar afetos controversos nos espectadores.


Quanto à postura corporal, notamos que os homens de Pejite estão sob o anteparo de uma arma, simultaneamente protegidos por ela e em posição de ataque. Já Nausicaä se coloca com postura totalmente exposta e seu contra-ataque é realizado através do desafio ético que seu corpo desarmado representa. É interessante observar o contraponto aqui estabelecido pelas imagens: os homens são caracterizados pela movimentação limitada, pelo uso de roupas pesadas e de arma de fogo, enquanto a mulher é retratada com leveza, movimentação ágil e sua arma é a determinação. Também cabe destacar que o vestido que ela usa na sequência foi-lhe emprestado por habitantes de Pejite para que ela pudesse fugir e tentar salvar o Vale do Vento. Assim, a personagem do Vale do Vento está vestida com roupas de Pejite e leva em seu ombro um pequeno animal.

 

Observa-se na sequência que a construção imagética e sonora dos seis planos em questão leva o espectador a identificar-se com Nausicaä e reagir emocionalmente à sua postura,       que é sublinhada pela música e endossada pelos símbolos que Nausicaä carrega. P4 e especialmente P6 nos apresentam não apenas a personagem Nausicaä, mas ela como representante de três diferentes povos [Vale do Vento, Pejite e animais] e uma possibilidade de união destes. Caso o Homem 1 atire nela, estaria atirando contra seu povo e afetaria conjuntamente o Vale do Vento e o universo dos animais, que fazem parte do cerne da narrativa. Não suficiente, o espectador também será afetado uma vez que é para o público que a metralhadora está apontada. Não é casual que seja também para o público que Nausicaä se coloca de braços abertos e demanda uma decisão.

 

A partir das análises acima empreendidas, é possível afirmar que na sequência selecionada há uma orquestração de elementos audiovisuais que convocam a identificação do espectador com Nausicaä e, mais do que isso, estabelecem um posicionamento em relação ao sacrifício que a personagem está disposta a fazer. Embora seja ela quem está colocando a vida em risco, é também ela quem tem a expressão serena e decidida. É a personagem que dá nome à história que se coloca de braços abertos para a ameaça, em oposição aos homens sem nome que se escondem atrás de uma arma e estão dispostos a atirar em alguém desarmado e que veste a roupa do seu povo [Pejite]. Para arrematar, é a postura decidida de Nausicaä que é acompanhada de música, artifício basal na regulação das reações da plateia [SHOHAT; STAM, 2006].

 

Considerações finais

O presente trabalho investigou uma sequência de “Nausicaä do Vale do Vento” [1984], filme de Hayao Miyazaki que foi amplamente difundido como tendo caráter ambiental. Propõe-se que, se por um lado, tal marca pode ter contribuído para aumentar o alcance e visibilidade do anime, por outro, acaba por eclipsar o que aqui se levanta como hipótese que seja o assunto principal do longa-metragem: a disposição de uma mulher jovem a se sacrificar para salvar os outros. Nessa direção, foi empregada a análise poética do filme em uma sequência de seis planos com o objetivo de rastrear como foram construídos alguns dos efeitos propostos pela obra. Observou-se que a continuidade dos frames faz com que o espectador seja colocado no lugar de Nausicaä e que tal composição comunica que atirar na personagem principal equivale a atirar contra os espectadores. A postura serena e decidida de Nausicaä é acompanhada de música, o que reforça as estratégias de mobilização da plateia em relação à personagem. Adicionalmente, as vestimentas da personagem e o fato de ela estar acompanhada de um esquilo-raposa elevam Nausicaä a uma esfera maior que si mesma, uma vez que ela representa três universos distintos [Pejite, Vale do Vento e mundo animal] e a possibilidade de união deles.

 

Como conclusão, pode-se afirmar que no segmento analisado os recursos cinematográficos foram utilizados no sentido de favorecer a identificação dos espectadores com a personagem principal e endossar sua atitude de sacrifício. Faz-se necessário dar continuidade à investigação em futuros trabalhos, selecionando outras sequências do filme a fim de tencioná-las entre si e estabelecer diálogos entre tais leituras e os movimentos sociais que marcaram a década de 1980 no Japão.

 

Referências

Thereza Cristina de Oliveira e Silva é mestranda do Programa de Pós-Graduação em História Social da Universidade Estadual de Londrina.

 

AKIMOTO, Daisuke. “Learning peace and coexistence with nature through animation: Nausicaä of the Valley of the Wind” in RITSUMEIKAN JOURNAL OF ASIA PACIFIC STUDIES, v. 33, 2014, p. 54-63.

 

GOMES, Wilson. “La poética del cine y la cuestión del método en el análisis fílmico” in SIGNIFICAÇÃO: REVISTA DE CULTURA AUDIOVISUAL, v. 31, n. 21, Jan-Jun, 2004, p. 85-105.

 

HAYAO Miyazaki in IMDb (Internet Movie Database). [S. l., s.d.]. Disponível em: https://www.imdb.com/name/nm0594503/#director.

 

MITCHELL, W. J. T. O que as imagens realmente querem? in ALLOA, Emmanuel (org). Pensar a imagem. Belo Horizonte: Autêntica, 2015. p. 165-189.

 

NAUSICAÄ do Vale do Vento. Direção: Hayao Miyazaki. Produção: Isao Takahata. Japão: Studio Ghibli, 1984. 1 vídeo (117 min.). Disponível em: https://www.netflix.com/br/title/70019062?s=a&trkid=13747225&t=cp&vlang=pt&clip=81234979.

  

NAPIER, Susan J. Anime from Akira do Howl’s Moving Castle: Experiencing Contemporary Japanese Animation. London: Palgrave Macmillan, 2005.

 

NOVIELLI, Maria Roberta. Floating Worlds: A short history of Japanese animation. Boca Raton: CRC Press Taylor & Francis Group, 2018.

 

ODELL, Colin; LE BLANC, Michelle. Anime. Harpenden: Kamera Books, 2013.

 

SHOHAT, Ella; STAM, Robert. Estereótipo, realismo e luta por representação. in SHOHAT, Ella; STAM, Robert. Crítica da imagem eurocêntrica: Multiculturalismo e representação. São Paulo: Cosac Naify, 2006. p. 261-312.

 

TIPTON, Elise. K. Modern Japan: A social and political history. Abingdon: Routledge, 2008.

6 comentários:

  1. Olá, Cristina, muito boa tarde.
    Me chamo Luis Sérgio Bentes Lopes, sou professor e historiador, paraense e vivo em Brasília.
    Parabéns pelo trabalho e pela cuidadosa análise de uma obra, em parte, um pouco negligenciada, até mesmo por quem admira o trabalho de Hayao. Minha pergunta é no sentido de tentar compreender aquilo que se harmoniza com o universo do autor e consequentemente com o público. Miyazaki é antes de mais nada extremamente sutil e carrega uma suavidade, no caso de Nausicaa, todos os elementos, assim como o vazio - de fundamental importância para o transcorrer da história - permeiam uma maneira, uma forma de comunicar, de forma semiótica e simbológica uma identificação reconhecível na obra dele, em Nausicaa, bem como em Mononoke Hime, há elementos da conjuntura natural e por vezes metafísicas, de dar animismo aos elementos da natureza: vento, seivas, chamas, carvão, pedras. Gostaria de saber, você, como investigadora desta narrativa em particular, percebeu algum outro elemento que de alguma forma se liguem à presença feminina na própria sociedade japonesa do período? Não precisam necessariamente ser os elementos metafísicos como citei, porém sua análise da composição de cena, do vestido, das armas e da ausência de homens e de propósito por parte deles me deixa curioso a respeito do que mais você teria encontrado, inclusive em outros pontos do filme.

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    1. Thereza Cristina de Oliveira e Silva4 de outubro de 2022 às 17:15

      Olá, Sérgio, boa tarde!
      Obrigada pela leitura e pelos comentários!
      É interessante a questão do animismo, confesso que ainda não tinha pensado especificamente nisso em relação ao Nausicaä. O que me ocorre em um primeiro momento é a questão do vento, pois quando estamos nos aproximando do clímax do filme, o vento para de soprar no Vale, o que causa espanto dos cidadãos mais velhos; e o vento volta a soprar após o ataque dos ohmus, indicando (junto com a música) que Nausicaä vai (sobre)viver.
      É bastante curioso que o kanji de vento (風) contém o kanji de inseto (虫), o que me leva à hipótese de que não seria possível o vento continuar soprando sobre o Vale na ausência dos insetos (no caso, dos ohmus). Dito de outra forma: parece-me que salvar o Vale só é possível porque os ohmus também são salvos.
      Gosto de pensar no vento como uma presença que norteia a narrativa e que Nausicaä é apresentada como uma lufada de ar que traz harmonia para o Vale do Vento e a possibilidade de convívio pacífico entre os humanos e o Mar Podre e seus habitantes.
      Seguindo no seu comentário, desde a perspectiva da sociedade japonesa do período, é interessante que o filme foi realizado em um momento em que movimentos feministas rejeitavam a ideologia "boa esposa, mãe inteligente". Penso que o filme endossa que as mulheres não têm que ser mães nem esposas, e que ao terem autonomia na sociedade elas podem alcançar grandes feitos.

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    2. Excelente, Cristina. Adorei a questão dos ideogramas japoneses também, muitas vezes isso pode apenas ficar como detalhe, mas é marcante pelo elemento substantivo e pelo símbolo. Gostei muito da réplica e, sinceramente, me provocou como historiador a buscar um pouco mais a sociedade da época. Graças a onda Hallyu, a Ásia está novamente em evidência e como não poderia deixar de ser, a sociedade japonesa, como uma das mais antigas e conservadoras é também uma das que mais produz formas de contornar o caos social e criticar seus problemas. Seja de forma mais crua, seja de maneira muito mais suave, como Miyazaki o fez em Nausicaä, e em tantas outras obras de seu tempo. Agradeço muito pela réplica e mais ainda por nos dar a oportunidade de entrar em contato com trabalho tão peculiar e sensível, unindo arte, cinema, história e sociedade.

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    3. Thereza Cristina de Oliveira e Silva6 de outubro de 2022 às 16:15

      Muito obrigada, Sérgio! Fico muito feliz com seu feedback! Torço pra que possamos voltar a trocar figurinhas em próximos eventos e oportunidades :)

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  2. Olá Thereza Cristina, adorei seu texto e o trato com a fonte, parabéns! Pensando no Miyazaki, ele já falou em algumas entrevistas sobre a sua opção por protagonistas femininas, que "não precisem de um salvador" e é uma narrativa presente em outros filmes do Studio. Você acredita que o sucesso de NAUSICAÄ DO VALE DO VENTO é um elemento importante na decisão do diretor em seguir por esse caminho narrativo em outras obras?
    Obrigada!
    Janaina de Paula do Espírito Santo

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    1. Thereza Cristina de Oliveira e Silva6 de outubro de 2022 às 09:16

      Olá, Janaina, bom dia! Obrigada pela leitura e pelo feedback! Interessante sua pergunta, eu tendo a acreditar que sim. Existe uma série de pequenos documentários sobre o Miyazaki realizada pela NHK (https://www3.nhk.or.jp/nhkworld/pt/ondemand/program/video/10yearshayaomiyazaki/?type=tvEpisode&) e em um dos episódios Miyazaki comenta que a realização do Nausicaä se deu em um momento muito decisivo de sua carreira, pois ele compreende que seria sua última chance de se lançar como diretor. Antes ele havia dirigido o Castelo Cagliostro (1979), cujo protagonista é um homem, que não teve grande repercussão. Penso que o sucesso de Nausicaä deve ter indicado um caminho narrativo que tocou o público e que foi sendo desenvolvido pelo diretor nos seus próximos filmes.

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