VOLTAIRE E A CHINA: DA ESTABILIDADE POLÍTICA A MODELO PARA A EUROPA DO SÉCULO XVIII por Ricardo Hiroyuki Shibata

 

A predileção de Voltaire (Jean-Marie Arouet) pela China é particularmente visível ao se examinar o conjunto de seus escritos de vária ordem. Naqueles de caráter filosófico, ou nos textos históricos, ou mesmo em sua obra ficcional, a China e a sua história multimilenar serviu de referência estratégica para a construção de uma nova civilização européia – justamente aquela que cumpriria os padrões disseminados pelo pensamento iluminista. Trata-se de um lugar insuspeitado no interior do pensamento voltairiano e mesmo a fortuna crítica acerca da filosofia Iluminista pouco percebeu a importância dessa temática para o pensamento do século XVIII. Mesmo porque a diatribe contra a ortodoxia católica ou a crítica aos jesuítas da Segunda Escolástica – de fato, os seus representantes mais exemplares – esteve basicamente no centro das atenções.        

 

No entanto, para Voltaire, a resposta estratégica para uma civilização, que ele considerava em decadência e imersa no obscurantismo, era justamente buscar na história antiga dos povos e nas suas respectivas culturas as matrizes e os modelos para uma reforma social de grande amplitude. Vale destacar, aqui, que, a partir disso, Voltaire nunca foi partidário de uma “revolução”, “rebelião” ou ainda uma “insurgência” política que abalaria os esquemas hierárquicos estabilizados no âmbito do Antigo regime (BERCÉ, 1987). A China forneceria, pelo contrário, várias práticas, hábitos e valores que, adaptados ao contexto coetâneo, reconduziria, de modo satisfatório, o sistema europeu de ordens, com seus graus diversos de subordinação, à estabilidade, à paz e à harmonia.       

 

De fato, Voltaire tratou a questão da Ásia e seus correlatos a partir da perspectiva da história cultural da Europa, em seu sentido mais amplo. Para ele, em vários momentos estratégicos, a filosofia iluminista deveria destacar a relevância das nações asiáticas, sem levar em conta, em certa medida, a distância geográfica e as diferenças culturais. Dessa forma, disseminado um pouco por vários textos, porém com ênfase em certos escritos de matiz cultural, podemos encontrar o que Voltaire pensava sobre a contribuição asiática para a história coetânea de um Ocidente que ele votava decadente (em seu aspecto civilizacional), tirânico (em suas matrizes políticas de base) e obscurantista (por seu viés de censura ao livre pensamento e à difusão de novas idéias).  (MALBRANCHE, 2021, pp.53-63)

 

No século XVIII, em que vicejava a Ilustração, a Ásia, conforme a imagem concebida por Voltaire – ou, pelo menos, a representação que tantos filósofos e letrados assim forjavam –, pouco tinha a ver com o exotismo ou com qualquer outra imagem de terras distantes, habitadas por povos sem lei, sem sistema governativo ou sem um vocabulário propriamente sofisticado. Nesse sentido, se a cultura européia destacou os indígenas americanos como destituídos de F, L e R, isto é, sem fé, sem lei e sem rei, os asiáticos tiveram muito melhor sorte. A Pérsia (de fato, o Oriente Médio e terras do Levante), a Índia e a China eram os opostos simétricos, todavia, em sinal contrário, de uma Europa que carecia das luzes da razão. Sob o rótulo de Ásia, Voltaire reconhecia uma série extensa de boas práticas civilizacionais que serviriam perfeitamente para rechaçar a escuridão que grassava sobre o Ocidente. (MAVERICK, 1946)

 

Desde muito cedo, é possível reconhecer na obra de Voltaire esse fascínio pelo Oriente, em que pesava uma mistura explosiva, intelectualmente falando, entre curiosidade e admiração. Em seu Essai sur le poème épique (primeira versão, publicada  em inglês, datada de 1727), Voltaire destacava que foram os portugueses os primeiros a trazer à luz o caminho marítimo para as Índias e, portanto, essa nova abertura europeia em direção ao Oriente, com seus cobiçados produtos e com seus povos inusitados. De passagem, na Idade Média, as terras orientais vinham descritas na narrativa de Marco Polo na corte do grande Cã e nos inúmeros relatos de peregrinação que descreviam os reinos para além da Terra Santa. Entretanto, esta obra voltariana, cujo fundamento se destaca por seu pioneirismo, é, como muitas vezes se disse, um longo ensaio de literatura (e de antropologia) comparada, em que se avaliam os grandes poemas épicos, desde o grego Homero ao inglês John Milton. É por isso, justamente, que permitiu um quadro comparativo de mais ampla gama, concorrendo diferentes costumes e hábitos de nações diversas. (VOLTAIRE, 1830)   

 

No entanto, é, no Essai sur les mœurs et l’esprit des nations, publicado em 1756, que Voltaire procurou desvelar, em detalhes, a história universal desde os caldeus aos ameríndios, passando pelos hebreus e os romanos. Aqui, um pouco de modo surpreendente para o nosso pensamento contemporâneo, estão presentes elementos de geologia, narração de milagres, conceitos de imortalidade da alma, e lendas e contos de caráter sobrenatural. O que não quadraria com um estudo histórico, cuja hermenêutica se fundamenta em documentação arquivística ou em método analítico de base cientificista. Escrito em estilo ligeiro e despretensioso, Voltaire analisa este impressionante conjunto de povos que constituem o gênero humano. No fundo, o objetivo é a clara defesa de uma tese lapidar: o gênero humano possui práticas, valores e crenças que são semelhantes em todos os lugares do mundo e que se estendem por um longo espectro temporal. Desde o início da humanidade, os homens tiveram superstições primitivas e sonhos premonitórios, além de padecerem a intervenção divina nas coisas terrenas e mundanas. O que conduziu Voltaire a formular o seu conceito de “religião natural”, vale dizer, o esboço de um quadro geral, de cariz moralizante, em que se representa “l’histoire de l’esprit humain” (VOLTAIRE, 1835, p.i).         

 

É estrategicamente neste contexto amplo que as figurações sobre o Oriente – a China, em particular – ganham enorme relevância. Trata-se, para Voltaire, do berço da civilização e de todas as artes, em que se podiam encontrar os costumes em seu estágio de formação, isto é, de uma racionalidade própria que ordenava os modos e os hábitos a partir de uma teleologia, cuja causa final era o progresso humano (VOLTAIRE, 1835, p.3).

 

Mais especificamente ainda, foram os chineses, segundo a periodicidade instituída por Voltaire, que primeiro criaram os vários usos da escrita e um sistema governativo regrado, com a acumulação de saberes fundados na construção de um dado regime de historicidade, compartilhado de modo coletivo e consuetudinário. Isto, enquanto os povos europeus conviviam com o iletramento, com a ausência das luzes do saber, com o caos das guerras tribais, com a fragmentação territorial e o espírito de dissenso.

 

Uma longevidade impressionante, pois foram quatro mil anos, com leis, costumes, língua, modo de vestir sem qualquer alteração relevante. A história chinesa começou em tempos imemoriais, segundo reza a tradição fundada em relatos orais, com as observações astrológicas, em que o conhecimento acerca do funcionamento dos eclipses exerceu papel estratégico. E foi justamente a partir disso, que foi possível o surgimento das dinastias, ligando “l’histoire du ciel à celle de la terre” (VOLTAIRE, 1835, p. 14). Além disso, foi a enorme inventividade dos chineses que possibilitou a criação dos tipos móveis para a imprensa, da artilharia, dos canhões e da pólvora, dos instrumentos astronômicos (astrolábio, bússola), e a impressionante descoberta das coordenadas geográficas com seus meridianos e paralelos. O que demonstrava cabalmente “la supériorité des Chinois sur les autres peuples d’Asie” (VOLTAIRE, 1835, p.25).   

 

E, para refutar os missionários e aventureiros europeus que descreveram a China como um sistema despótico, Voltaire esclarece que “dans les plus anciens temps de la monarchie, Il fut permis d’écrire sur une longue table, placée dans le palais, ce qu’on trouvait de répréhensible dans le gouvernement” (VOLTAIRE, 1835, p.28). O que invalidava a tese de Montesquieu, em seu O espíritos das leis, e as suas “imputations vagues” (Idem, Ibidem). Mesmo porque, “Tous les vices existent à la Chine comme ailleurs, mais certainement plus reprimés par le frein des lois, parce que les lois sont toujours uniformes” (Idem, Ibidem).

 

De fato, em meados do século XVIII, a proliferação de narrativas de viagens, descrevendo as peripécias e aventuras dos viajantes na China, fez a balança pender dessa admiração voltairiana – uma sinofilia – para um desprezo pela barbárie – uma sinofobia (COUTEL, 2009, pp.47-54). Essas descrições que desvelavam a sociedade, a cultura, a política e a natureza chinesas acabaram por contaminar a próprio conceito que os europeus conceberam sobre a Ásia, de modo geral. Voltaire se manteve fiel à idéia de que a China conseguiu desenvolver a contento o conceito de liberdade (aquele conceito que era chave no contexto da Ilustração). Para ele, o que ocorreu, em verdade, foi que a China conseguiu repelir a influência perniciosa do Cristianismo, em particular, aquele fanatismo propagado pela Igreja Católica em sua versão pós-Concílio de Trento.

 

Nesse sentido, é perfeitamente possível afirmar que Voltaire pregava a adoção do modelo chinês em seus aspectos de administração, de governo e de aplicação das leis. Isto, porque os vários níveis do Estado deveriam ser conduzidos por uma elite fundada numa meritocracia intelectual. A China forneceria, então, as bases e as matrizes fundamentais para a construção de um regime político que conseguiria cumprir os objetivos da civilização, em seu pleno sentido. A partir deste ponto, o maior problema para Voltaire não era convencer o seu público-leitor de que, em algum lugar e em algum momento, houve sociedades e civilizações mais desenvolvidas que a civilização européia setecentista. A questão central era pensar que o ápice da civilização fosse aquela construída pelos chineses. O mais forte argumento para Voltaire – e também para os partidários iluministas da sinofilia; Quesnay, por exemplo – era que o sistema chinês se manteve estável por longo tempo. E a manutenção dessa estabilidade era estrategicamente proporcional à força de uma dada civilização. (PAGDEN, 2007, p.56s)

 

Entretanto, as maravilhas e as conquistas do país oriental, que os textos fartamente informaram, bastavam para provar que se tratava de um exemplo bem acabado de grandeza econômica e de grandeza cultural. Enquanto, para a Europa, restava a divisão em diversos poderes concorrentes, o dissenso entre as facções políticas e a alternância entre tempos de fartura e de declínio, o Império chinês vicejava, permanecendo imune aos tormentos das várias sucessões temporais e as suas respectivas mudanças. A história trouxe para a Europa, a imprevisibilidade e, com isso, a instabilidade, pois nunca houve paz verdadeira entre a queda do Império romano até o reinado de Carlos Magno. De fato, segundo Voltaire, a França, por exemplo, seria pacificada apenas no reinado de Luís XIV; momento, em que atingiria seu ápice civilizacional.  (PAGDEN, 2007)

 

Em verdade, Voltaire era uma voz dissonante no contexto intelectual do Iluminismo, que era basicamente dominado pela imagem de uma China despótica e povoada de exotismos – até culminar, no século XIX, com o “chinesismo” (as chinoiseries que a burguesia parisiense venerava como traço de sofisticação). Desse outro lado, pensadores e escritores do quilate de Montesquieu, Daniel Defoe, Adam Smith, Denis Diderot, marquês de Condercet, Jacques Turgot – cada um em seu próprio escopo – ajudaram a consolidar uma visão eurocêntrica do mundo, que relegava a China (e o Oriente, de maneira geral) como país inferior aos países ocidentais.

 

Quer dizer, tudo aquilo que Voltaire reconhecia como virtudes e valores que mantiveram a China como grande império, fora tratado com enorme desprezo. Dessa forma, a famigerada estabilidade chinesa significava inércia e consolidação de uma tradição arcaica. As rebeliões locais e as guerras civis eram sinônimo de consciência social e de reivindicação de direitos. O sistema de mandarinato chinês não era uma forma de pacificação “temperada” ou “esclarecida” de inúmeras vontades e interesses, mas simplesmente corrupção desenfreada e arbitrariedade. O poder imperial, com sua aura transcendente e religiosa, nada possuía de “poder ilustrado”; era apenas outra forma (a forma mais perversa) de despotismo (TERRÓN BARBOSA, 2010, pp.267-277; ICHIKAWA, 1979, pp. 69-84)

 

No limite, foi justamente essa visão sinofóbica que mais tempo permaneceu (e, de certo feita, ainda permanece) nas representações que tratam da China (DU PLEISS, 1998, pp.145-160). As obras políticas de Montesquieu, apenas para referir o mais conhecido dos teóricos políticos do século XVIII, se esforçaram por refutar o sistema governativo chinês e sua pretensa caracterização, com seu viés ilustrado, em “despotismo esclarecido”, ou seja, naquilo que estrategicamente se considerava a perfeição do Estado e a consecução de uma sociedade igualitária (pelo menos, em termos jurídicos), em que se mantinha a harmonia, a concórdia e a estabilidade ao longo do tempo (MONTESQUIEU, 2000, p.211). Por outra, para François Quesnay e os pensadores da teoria fisiocrata (QUESNAY, 1767), contemporâneos de Voltaire, o povo chinês entendeu, desde o inicio dos tempos, que a acumulação de riqueza em grande escala, sobretudo, envolvendo o conjunto da nação, e a garantia de que a prosperidade era um direito dos cidadãos, era o objetivo mais importante da sociedade. Aqui, a agricultura desempenhava papel central não apenas para a sobrevivência da população, em termos de segurança alimentar, mas também como forma de angariar enriquecimento e engrandecimento do Estado. O que quadrava perfeitamente com a doutrina antiga da “economia” (do oikós), conforme as coordenadas centrais do governo da casa, da família, e da obtenção de sustento e incremento de patrimônio. 

 

Referências

Ricardo Hiroyuki Shibata é Doutor em História/Teoria Literária (Unicamp) e Pós-Doutor em História da Cultura e das Mentalidades (UFPR).

 

BERCÉ, Yves-Marie. Revolt and Revolution in Early Modern Europe. Manchester: Manchester University Press, 1987.

 

COUTEL, Charles. Voltaire et la Chine. L’Enseignement philosophique, n.4, 2009, 59e Année, pp.47-54

 

DU PLEISS, Eric. L’influence de la Chine sur la pensée française au dix-huitième siècle: état présent des travaux. Dalhousie French Studies, v.43, Summer 1998, pp.145-160

 

ICHIKAWA, Shin-Ichi. Les mirages chinois et japonais chez Voltaire. Raison présente, Année 1979, n.52, pp.69-84.

 

MALBRANCHE, Benoît. La Chine, modèle de tolérance de Voltaire. In: _____.  Les origines chinoises du libéralisme. Paris: Institut Coppet, 2021, pp.53-63.

 

MAVERICK, Lewis A.. China. A Model for Europe. San Antonio: Paul Anderson Co., 1946.

 

MONTESQUIEU. Charles de Secondat, Baron de. O Espírito das Leis. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

 

PAGDEN, Anthony. The Immobility of China: Orientalism and Occidentalism in the Enlightenment. In: WOLFF, Larry & CIPOLLINI, Marco (Ed.). The Anthropology of the Enlightenment. Stanford: Stanford University Press, 2007.

 

QUESNAY, François. On Chinese Despotism. Paris, 1767.

 

TERRÓN BARBOSA, Lourdes. Images de la Chine dans l’oeuvre de Voltaire. Thélème. Revista Complutense de Estudios Franceses, 2010, v.25, pp.267-277.

 

VOLTAIRE. Essai sur les mœurs et l’esprit des nations. Paris, Treutel et Würtz, 1835. 

 

_____. Essai sur le poème épique. Paris, 1830.

8 comentários:

  1. Caro Ricardo, um excelente texto, parabéns! Voltaire é um de meus personagens preferidos ao se falar de China na Europa do século 18. Gostaria de perguntar: você notou se ele concebeu, em algum momento, um modelo ou proposta para viabilizar a importação desse ideal sínico de governança e sociedade? Ou ele se circunscreveu a ideia da China como modelo de exemplo e inspiração? Grato! =)

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  2. Olá André,
    Duas perguntas complementares e mutuamente dependentes, pois conseguem dar conta precisamente do ideário de Voltaire, sobretudo, em seus aspectos de pensamento político.
    Não foi por acaso que Voltaire dedicou um parte relevante e substancial de seu trabalho a desvelar a "história cultural" da China. De fato, para ele, o povo chinês conseguiu, ao longo do tempo, constituir um Estado a partir de um "poder centralizado" (um poder despótico). Assim, constituía-se em exemplo e inspiração, conforme você muito bem referiu, mesmo porque basta pensar nas semelhanças que ele encontrou com o reinado de Luís XIV. Em particular, em sua obra teatral, é conhecida a sua tentativa de emular e dar continuidade aos esforços de Racine e Molière, grandes autores do século XVII. De passagem, ainda falta um estudo, de maior fôlego, sobre a temática asiática e oriental na produção dramática de Voltaire.
    Além disso, fazendo um recorte estratégico, Voltaire reconhecia, na China, a constituição bem sucedida de um grupo de letrados que serviria de suporte às elites governantes, incorporando, assim, no contexto europeu, os ideais do Iluminismo. É justamente, a partir disso, que ele vai fundamentar a sua proposta de "despotismo esclarecido".
    Muito grato pelas questões e pela oportunidade do debate.
    Ricardo Shibata

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  3. Caro Ricardo, pasme, meu primeiro projeto para um doutorado em filosofia foi uma discussão sobre o Oriente em Voltaire. Seu texto foi pra mim um feliz reencontro com um tema que me interessa muito! Eu gostei bastante do seu texto, e ainda fico pensando como o Voltaire pretendia viabilizar isso... os jesuítas acabaram importando o sistema de exames [que viraram os nossos concursos e vestibulares], mas fosse qual fosse o projeto, a revolução atropelou tudo isso.... Grato pelo debate, ótimo texto! =D

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    1. Caro André Bueno,
      Para mim, é interessante perceber que muitos críticos de Voltaire e também do reinado de Luís XIV denunciavam a "teatralização" do poder, ou seja, os atores sociais se constituíam em meros coadjuvantes de um protagonismo monárquico.
      E, a crítica tinha muito fundamento. Nos séculos XVII-XVIII, a tendência do monarca era "sequestrar" os poderes locais e parcelares em nome de uma instância superior, que era obviamente aquela ocupada pelo realeza.
      O esforço de Voltaire era demonstrar que essa ocupação era um desdobramento lógico e coerente da lei natural. À época, havia uma máxima em Portugal (na Península Ibérica, de modo geral, mas perfeitamente extensível a outras monarquias europeias do período) que dizia: "o rei onde pode, não onde quer". Em devidas proporções, para Voltaire, esse "querer" era um "poder" natural (ungido por Deus), hierárquica (superior em termos sociais) e politicamente (a "cabeça" majestática comanda e ordena os outros "membros" do corpo) constituído.
      Agradeço encarecidamente pelas palavras de apreço ao meu trabalho e também fico muito feliz por trazer à sua memória uma lembrança tão cara à sua bem sucedida trajetória acadêmica.
      Ricardo Shibata

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  4. FERNANDA FRANCO ALVES AZEVEDO5 de outubro de 2022 às 09:12

    Olá Ricardo, parabéns pelo texto. Me chamou bastante atenção este trecho: "Nesse sentido, é perfeitamente possível afirmar que Voltaire pregava a adoção do modelo chinês em seus aspectos de administração, de governo e de aplicação das leis. Isto, porque os vários níveis do Estado deveriam ser conduzidos por uma elite fundada numa meritocracia intelectual". Diante da sua pesquisa, poderíamos dizer que no pensamento de Voltaire temos uma gênese do que hoje se convencionou chamar de TECNOCRACIA?

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    1. Cara Fernanda,
      Sua observação é perfeita. No pensamento de Voltaire o "despotismo esclarecido", que ele pregava com bastante vigor, necessitava, em decorrência de sua própria constituição como instância superior e única, de um aparato burocrático e estatal, formado por um corpo de "servidores" altamente especializado. Isto, não apenas em termos daquilo que hoje propriamente chamamos de administração pública, porém, conforme as coordenadas mais específicas do período, de uma miríade de outros atores sociais, igualmente especializados em suas respectivas áreas de atuação (intelectuais, artistas, escritores etc.). Esse "corpo técnico" seria a extensão e a representação mais bem acabada do poder despótico; muitas das vezes, com o mesmo estatuto de arbitrariedade e liberdade de volição.
      Daí, a pertinência de denominá-lo "tecnocracia".
      Muito grato pela pergunta.
      Ricardo Shibata

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  5. Olá Ricardo, parabéns pelo texto. Me chamou bastante atenção este trecho: "Nesse sentido, é perfeitamente possível afirmar que Voltaire pregava a adoção do modelo chinês em seus aspectos de administração, de governo e de aplicação das leis. Isto, porque os vários níveis do Estado deveriam ser conduzidos por uma elite fundada numa meritocracia intelectual". Diante da sua pesquisa, poderíamos dizer que no pensamento de Voltaire temos uma gênese do que hoje se convencionou chamar de TECNOCRACIA? FERNANDA FRANCO ALVES AZEVEDO

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  6. Olá Fernanda,
    Já respondi seu questionamento no item anterior. Mais uma vez, agradeço pela pergunta.
    Ricardo Shibata

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