OS DOIS LADOS DA MESMA MOEDA: COMO O JAPÃO É IMAGINADO PELOS FÃS E CRÍTICOS por Lucas Marques V. Motta e Luciana de Ávila Freitas

 

Introdução

No Brasil, existem dois discursos conflitantes sobre os animes (animação japonesa) e os mangás (quadrinhos japoneses). De um lado, há uma incitação negativa sobre as obras, encarando-as como objetos nocivos; do outro, observa-se um tratamento apaixonado, quase visceral. Apesar de dissonantes, os discursos se coadunam na medida em que imaginam o Japão; seja na sua forma negativa, seja na sua forma romantizada. Analisemos os casos.

 

O Japão como uma entidade maligna

Desde que os animes e mangás foram introduzidos no Brasil, eles vêm sendo acusados por religiosos, principalmente da doutrina neopentecostal, de influenciar negativamente crianças e jovens. O teor das denúncias além de serem fundamentalistas, apresentam-se como Orientalistas. Para dar seguimento ao assunto, convém entender o que esse conceito evoca.

 

Para Edward Said (2007), tanto o Ocidente quanto o Oriente carecem de estabilidade ontológica, sendo construções que trabalham no campo da ficção. Prestam-se assim a mobilizações de caráter emotivo, os quais incluem a manipulação, o medo e o ódio [SAID, 2007, p. 13]. Como na maioria das vezes é o Ocidente quem cria essas ficções e considerando ainda a história de colonização e imperialismo, é no estudo sobre a construção do Oriente pelo Ocidente que Said se dedica. Justamente por esse histórico, afirmam-se as relações de poder entre os dois blocos:

 

[...] o Orientalismo pode ser discutido e analisado como a instituição autorizada a lidar com o Oriente – fazendo e corroborando afirmações a seu respeito, descrevendo-o, ensinando-o, colonizando-o, governando-o: em suma, o Orientalismo como um estilo ocidental para dominar, reestruturar e ter autoridade sobre o Oriente [SAID, 2007, p. 29].

 

Sendo assim, entende-se o Orientalismo como um discurso produzido e manejado no interior da cultura europeia, que se dispôs a criar imagens contrastantes do Outro como forma de reafirmar a identidade do Nós [SAID, 2007, p. 29-30]. Daí as razões por trás das representações estereotipadas e muitas vezes malignas dos asiáticos, já que essa atitude também define o lugar do Ocidente como padrão virtuoso. Posição que irremediavelmente coloca o Outro numa posição de desumanização [SAID, 2007, p. 30].

 

Não se pode afirmar, no entanto, que o Orientalismo determina tudo o que pode ser dito sobre o Oriente. Existem relações de interesse por trás do que deve ou não ser comentado. Do mesmo modo não se afirma que o Oriente é uma criação sem realidade correspondente. No entanto, o fato é que essa realidade filtra o Oriente na consciência Ocidental [SAID, 2007, p. 30-32].

 

Eis que o Orientalismo é aplicado no Brasil. Em 2000 estreou Yu-Gi-Oh! (1998) no programa matinal TV Globinho (2000-2015), da emissora Globo. Desde a estreia, disseminou-se nas igrejas evangélicas a crença de que esses desenhos eram diabólicos, sendo que o ponto alto desse alarde ocorreu quando um apresentador de televisão, Gilberto Barros, apresentou no programa Boa Noite Brasil (2003-2007), na TV Bandeiras, acusações sobre o anime Yu-GI-Oh! se relacionar com o ocultismo e com a Yakuza (máfia japonesa). Durante uma semana os ataques do apresentador continuaram, chegando ao ponto de trazer outras obras, como Dragon Ball (1986-1989), para corroborar seu argumento de que animes eram imorais e perigosos. A reação foi imediata. Por todo o Brasil, pais especialmente religiosos proibiram seus filhos de assistirem o anime, bem como descartaram o card game que se remetia ao desenho. Yu-GI-Oh! não foi o único anime perseguido. Um caso parecido aconteceu em 2004. O Ministério da Justiça proibiu a Globo de transmitir no programa matinal o anime InuYasha (2000-2004), com o argumento de que a obra era violenta demais para o horário. Na imprensa, a informação chegou a ser noticiada como uma vitória para os religiosos: “Governo veta ‘demônio’ de manhã na Globo”.

 

Mais recentemente, outra obra foi alvo de críticas. No dia 17 de outubro de 2021 foi ao ar no Domingo Espetacular (2004-) uma matéria de 11 minutos, alertando sobre o perigo dos desenhos violentos. O maior exemplo citado foi o anime Death Note (2006-2007), cuja classificação etária é entre 16 e 18 anos. Na história, existe um caderno capaz de matar aqueles cujos nomes forem escritos nele, desde que seus rostos sejam visualizados no ato. Devido a esse recurso narrativo, a obra foi vilanizada. Noticiou uma das apresentadoras do programa: “Especialistas denunciam que muitas crianças estão acessando material que tem uma aparência inofensiva, mas que trazem cenas de violência explícita capazes de chocar até a um adulto e provocar sérios danos à saúde mental”. Vê-se que o tom moralista ganha respaldo de especialistas, mas durante toda a reportagem, apenas três desses especialistas são citados: um sociólogo, um psicoterapeuta e uma psicóloga. Sob o jugo das suas constatações, eles determinam não apenas o que as crianças devem consumir, mas também o que é potencialmente perigoso para a cultura. Devidamente coroados com togas, agem, portanto, como instâncias de julgamento. Em um trecho, o psicoterapeuta afirma: “Infelizmente a nossa cultura vem abraçando a morte e a violência cada vez mais frequentemente. É o interesse de uma indústria que lucra bilhões com o estado do cérebro de angústia, medo, solidão e ansiedade”. Em outro ponto, o mesmo consultor julga: “Isso é um lixo tóxico. Isso é a incivilidade, a desumanização, ali consagrada como algo legal”.

 

Polêmica e sensacionalista, a reportagem carece de criticidade, o que fica nítido pelo erro de algumas informações (por exemplo, informam errado a data de estreia do anime). O último trecho citado da matéria resume a atitude de Orientalismo tomada. Se o Japão produz incivilidade e desumanização, seriam os japoneses bárbaros e não-humanos? Por outro lado, seriam os brasileiros civilizados e humanos, já que supostamente pertencem ao Ocidente?

 

A matéria foi ao ar na rede de televisão Record TV, de propriedade de Edir Macedo. Um dos homens mais ricos do Brasil que tem sob seu comando também uma das instituições religiosas mais ricas, a Igreja Universal. A mesma igreja que prestou assistência à escalonada da Extrema-Direita no Brasil, que resultou na eleição desastrosa de Jair Messias Bolsonaro. Mídia, política e religião, assim, confundem-se, formando uma combinação perigosa que atende aos projetos de poder das grandes elites brasileiras. E para continuar detendo esse poder, convém a estes grupos fornecer a base do Nós, construída, sobretudo, na máxima “deus, pátria e família”. Logo, entende-se porque há anos os animes e mangás vêm sofrendo não apenas críticas severas, mas também censura. Porque são conteúdos que pertencem ao Outro. E porque esse Outro não participa da concepção judaico- cristã Ocidental, os animes permaneceram à sombra do entretenimento por muito tempo. Mesmo com a globalização alçando níveis mais altos na atualidade, ainda impera, pelo menos em espaços fundamentalistas, uma condenação a estas obras.

 

O Japão maravilhoso

Se existem aqueles que depreciam a cultura japonesa, também existem aqueles que a apreciam profundamente. A garantia de sucesso no Brasil pode ser devido ao fato de haver em solo nacional a maior comunidade nipônica fora do arquipélago, mas o triunfo dos animes e mangás vai além das nossas fronteiras, sendo um fenômeno mundial.

 

O primeiro fator de sucesso tem a ver com a proximidade de três indústrias culturais. No Japão, os animes, mangás e videogames relacionam-se de modo a alavancar o engajamento das obras separadamente, o que consequentemente beneficia todos os audiovisuais. Essa relação estreita é chamada por Henry Jenkis de narrativa transmidiática [2011]:

 

A narrativa transmídia representa um processo em que elementos integrantes de uma ficção são dispersos sistematicamente por vários canais de distribuição com o objetivo de criar uma experiência de entretenimento unificada e coordenada. Idealmente, cada meio faz sua própria contribuição única para o desenrolar da história [JENKIS, 2011].

 

Nesse processo, diferentes mídias atraem diferentes nichos. Assim, um fã pode procurar uma experiência diferente da obra que gosta, consumindo um produto audiovisual distinto. De outra forma, uma pessoa pode não se identificar com uma mídia, mas ser perfeitamente aberta a outra [JENKIS, 2003]. Em qualquer aspecto, as indústrias que participam desse circuito beneficiam-se. Pensando no caso brasileiro, podemos citar o exemplo de Pokemón. Certamente a animação não seria tão popular no Brasil, se ela não fosse acompanhada por videogames e cards games, que promoveram não apenas um alargamento de experiências, como também criaram uma verdadeira comunidade de fãs interessados em compartilhar dicas, novidades e cards.

 

Outro motivo para o êxito internacional se deve em boa parte aos produtos conhecidos como mukokuseki, literalmente “sem nacionalidade, sem estado”. Em outras palavras, a ausência de marcas culturais que identifiquem as origens das obras, possibilita um acolhimento maior em países para além do arquipélago. Convém lembrar aqui alguns sucessos, cujos títulos não possuem nomes japoneses e também ambientam-se em mundos imaginários: Zelda, Mario e Sonic [MANGIRÓN, 2012, p. 35]. O sucesso dessas obras deve-se, portanto, à identificação que geram em diferentes públicos.

 

Citemos o terceiro motivo que fizeram os animes e mangás conquistaram uma legião de fãs pelo mundo. Trata-se da distribuição ilegal dos animes e mangás. Apesar destes serem “uma agressão à propriedade, uma afronta às relações de mercado e darem prejuízo aos produtores e detentores das patentes ou direitos originais” [BRITO, 2013, p. 21) sua dinâmica é muito mais complexa do que inicialmente pode parecer. Mesmo que os produtos piratas atuem como concorrentes dos originais, gerando-lhes prejuízo, eles atendem mercados onde aqueles produtos são inacessíveis. Sem contar que mesmo de maneira torta, ajudam a difundir os originais nesses espaços [IBIDEM, p. 21]. Assim, quando um título é licenciado num determinado país, ele é recebido por fãs ansiosos em consumi-lo.

 

No Brasil, os animes foram introduzidos na década de 1960, mas ganharam projeção apenas na década de 1990, quando boa parte dos lares brasileiros já contavam com uma televisão [SATO, 2007, p. 27]. No final desta década registaram-se os primeiros eventos da cultura otaku. A partir daí mais e mais eventos dedicados aos fãs surgiram, pipocando em todas as partes do Brasil. O fenômeno não passou despercebido socialmente. Como mencionamos antes, parte da febre que os produtos culturais japoneses provocaram no Brasil, levou os pais e a mídia fundamentalista a se manifestarem negativamente sobre. Mas conforme as gerações mais antigas foram dando lugar às mais novas; conforme a globalização se expandia, bem como a tecnologia, as produções japonesas foram se tornando cada vez mais aceitáveis. Um exemplo dessa aceitação pode ser verificada na presença delas dentro do maior programa mainstream do Brasil, a novela. Em 2017 foi ao ar a novela A força do Querer, no horário nobre da Rede Globo. Na trama, o personagem Yuri (Drico Alves) mostra o cotidiano de um otaku (no Brasil o termo é usado para designar fãs de animes e mangás) que faz cosplay (atividade onde um fã se caracteriza de um personagem específico, podendo também dramatizá-lo) e participa de eventos. Apesar dos estereótipos e críticas na representação da comunidade de fãs, a proposta da trama visava retratá-los positivamente, o que contrasta com a antiga visão da comunidade.

 

Mas nem tudo é belo como aparenta. Assim como toda base de fãs, existem aqueles que se deixam levar pelas paixões. Frequentemente, entre os otakus, disseminam-se pensamentos sobre o valor cultural do Japão em detrimento do Brasil, o sonho da residência no arquipélago e a superioridade étnica dos japoneses. Em qualquer um desses cenários, desconsidera-se a realidade nipônica. A imagem que os fãs projetam sobre o Japão é idealista, portanto, descolada da realidade. A bem da verdade, existem diversos impedimentos para um estrangeiro morar no arquipélago. Mesmo quem nasce no país não tem direito à cidadania, uma vez que lá imperam as regras do jus sanguinis (citando apenas um dos embargos ao direito da cidadania). Quanto à ideia de superioridade japonesa por estrangeiros, algumas observações devem ser feitas. Muito do que se idealiza sobre o arquipélago, deve-se ao imaginário Orientalista, que prega sobre o excessivo coletivismo japonês, a estrutura hierárquica da sociedade, a produtividade no trabalho e o sucesso educacional. Ao deparar-se com esses fatos, que na verdade configuram-se como problemas sociais no Japão, os fãs estrangeiros de anime e mangá romantizam de forma insensata o país que é objeto de sua adoração — como exemplo, podemos citar o fato do Japão ser um dos únicos lugares no mundo que adotou um conceito próprio para designar aqueles que morrem por excesso de trabalho: karoshi. Portanto, longe de ser admirável, o labor em demasia é um problema social grave.

 

Conclusão

Como observamos, muito do que se julga sobre o Japão, se julga por meio dos produtos culturais exportados pelo país. Se existem olhares censuradores e moralistas, também existem olhares demasiadamente românticos. Com isso observamos não apenas a importância da cultura pop para a autoimagem do Japão, como analisamos também que o entendimento sobre o arquipélago é caracterizado pelo Orientalismo, pois mesmo aqueles que veem com amor o país, o fazem se apropriando dos estereótipos acerca dele.

 

Importante é mencionar que, apesar das visões negativas sobre o Japão, pelas lentes conservadoras, prevalece um olhar mais receptivo nas sociedades ocidentais sobre os animes e mangás. Esse é um movimento geracional que aceita e convive melhor com a cultura pop, de modo geral. O que não quer dizer que se deva baixar a guarda para as análises críticas sobre as mídias japonesas, uma vez que elas fazem parte do movimento Japan Cool.

 

O Japan cool é caracterizado pela noção de soft power de Joseph Nye (1990).  Basicamente, este último conceito se refere ao alinhamento político de uma nação com as produções culturais gestadas no interior do país, sendo essa estratégia conhecida pela faceta de um imperialismo brando. No caso do Japão, a imagem que suas mídias projetam é de um país jovem, descolado e alegre; portanto, uma imagem amistosa [NYE, 1990 apud MCCLELLAND, 2017, p. 6]. Esse seria o Japan Cool. Assim, enfatizamos a importância de estudar as mídias japonesas, posto que são fontes ímpares para o entendimento da cultura nipônica, bem como da sua identidade.

 

Referências

Lucas Marques Vilhena Motta é doutorando em História pela UFPel

Luciana de Ávila Freitas é mestranda em História pela UFPel

 

BRITO, Quise Gonçalves. Animê como recurso de soft power: comunicação e cultura na situação de globalização. 2013. 187 f. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2013.

 

ESPECIALISTAS alertam para os perigos da exposição de crianças a conteúdos violentos de séries e desenhos. R7, São Paulo, 17 de out. de 2021. Disponível em: <https://recordtv.r7.com/domingo-espetacular/videos/especialistas-alertam-para-os-perigos-da-exposicao-de-criancas-a-conteudos-violentos-de-series-e-desenhos-17102021>. Acesso em: 22 de set. de 2022.

 

GARGIA, Fábio. Death Note e a “demonização” de animes pela televisão brasileira. Disponível em <https://www.omelete.com.br/anime-manga/death-note-record-materia>, acessado em 25/02/2022.

 

JENKIS, Henry. Transmedia 202: further Reflections. 31 de jul. de 2011. Disponível em: <http://henryjenkins.org/blog/2011/08/defining_transmedia_further_re.html>. Acesso em: 20 de set. de 2022.

 

JENKIS, Henry. Transmedia Storytelling. 15 de jan. de 2003. Disponível em: <https://www.technologyreview.com/2003/01/15/234540/transmedia-storytelling/>. Acesso em: 20 de set. de 2022.

 

MANGIRÓN, Carmen. Manga, anime y videojuegos japoneses: análisis de los pricipales factores de su éxito global. Puertas a la Lectura , v. 24, p. 28-43, 2012.

 

MCLELLAND, Mark. Negotiating “cool Japan” in research and teaching. IN: MCLELLAND, Mark (ed.). The End of Cool Japan: Ethics, Legal, and cultural challenges to Japanese popular culture. New York: Routledge, 2017, p. 1- 30.

 

PREVIDELLI, Fábio. Nos anos 2000, cartas de Yu-Gi-Oh! foram demonizadas. Disponível em <https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/a-lenda-urbana-do-baralho-a-polemica-em-torno-das-cartas-de-yu-gi-oh-nos-anos-2000.phtml>, acessado em 25/02/2022

 

SAID, Edward Wadie. Orientalismo: O Oriente como invenção do Ocidente. trad. Rosaura Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.

 

SATO, Cristiane. JAPOP: O poder da Cultura Pop Japonesa. São Paulo: NSP-Hakkosha, 2007.

15 comentários:

  1. Grato Lucas Marques e Luciana Freitas ,pelas comunicaçoes. Lembro que a febre dos animes no Brasil começou em 1994 ,com a exibiçao dos Cavaleiros do Zodiaco na extinta Tv Manchete . De la pra ca nao se viu fenomeno igual no nosso pais. A respeito das criticas aos animes , os proprios Cavaleiros do Zodiaco foram severamente demonizados na epoca ,mesmo sendo um fenomeno que marcou geraçoes ,seja pela dita violencia , por exemplo vide a epica batalha entre Shiryu e Mascara da Morte ,uma das mais emocionantes de todos os animes, no qual o heroi de Dragao se sacrifica para salvar os companheiros.Penso que essa ideia de demonizar os animes e a cultura de um pais parte do medo de enxergar beleza no ''outro'' . Nosso pais e muito provinciano mentalmente ,bloqueia oque e diferente , e sofre com isso cultural e economicamente ,pois a cultura pop japonesa e um nicho lucrativo com um publico gigantesco , e por outro e um fechamento que nao sabe e nao quer aproveitar essa febre que sao as produçoes japonesas e asiaticas que sao fenomenos no mundo inteiro. Sobre a visao idealizada que as pessoas que consomem a cultura pop do Japao ,penso que as pessoas deveriam ver as culturas por outros angulos ,falta mesmo de uma cultura antropologica de base nos jovens que consomem essas produçoes asiaticas. Abraços, Ricardo dos Santos Barbarra

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    1. Este comentário foi removido pelo autor.

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    2. Olá, Ricardo. Muito obrigada pelo comentário!

      Interessante tu tocar no ponto da violência. Como eu comento no texto, esse conteúdo mais agressivo, muitas vezes com conotações sexuais, impulsionou muito as críticas aos animes. Não só no Brasil, como nos países de orientação judaico-cristã. Inicialmente isso dificultou a difusão do anime, mas a força dele acabou prevalecendo no fim.
      Interessante teu palpite sobre a beleza. Talvez dê para pensar isso na discussão das identidades, porque no final é essa a grande questão. Demonizar o Outro, reforça a identidade do Nós.

      Com certeza falta! Não apenas com a cultura pop japonesa. Falta mais reflexão sobre o que se consome.

      Um grande abraço, Ricardo!

      Luciana de Ávila Freitas

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    3. Oi, Ricardo. Muito obrigado pelo teu comentário!

      Concordo com os pontos expostos por ti e pela Luciana. Retomando a fala da Luciana, essa dualidade "nós" e "eles" é essencial na constituição de qualquer identidade, portanto o contrário também torna-se válido, ou seja, os japoneses também podem apresentar interpretações preconceituosas da "cultura ocidental".
      Se pensarmos em animes e mangás, representações do Brasil e dos brasileiros, por exemplo, podem ser bem caricatas (só lembrar de Captain Tsubasa e Inazuma Eleven). Sobre essas reflexões, recomendaria a leitura da pesquisa do sociólogo Kosaku Yoshino que analisa o nacionalismo étnico japonês (livremente traduzido como Nihonjinron). Chama atenção as entrevistas do pesquisador com empresários japoneses, os quais se veem mais bem sucedidos no mercado por características culturais nipônicas ausentes nos ocidentais.
      Outra recomendação interessante é o artigo Rising Sun, Iron Cross do Matthew Penney. No artigo, são abordadas representações do militarismo germânico na cultura popular japonesa. O autor mostra que nessas representações o "outro", no caso militares alemães, muitas vezes é apresentado como um repositório de características negativas, tornando-os inimigos facilmente reconhecíveis (exemplo a animação clássica Space Battleship Yamato).
      Fica minha contribuição ao debate.
      Novamente, muito obrigado pelo comentário!
      Assinado: Lucas Marques Vilhena Motta

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  2. Olá, Lucas e Luciana. Tudo bem?
    Gostaria de parabeniza-los pela comunicação excelente e importantíssima. É bem notório o papel ambíguo que a grande mídia brasileira possui em relação aos animes, seja como emissora mas também como carrasca da arte. Levando em consideração os ocorridos que variam entre o "pânico satânico" relacionado a "Yu-Gi-Oh!" e o sensacionalismo exacerbado rondando "Death Note", como é possível romper com a visão discriminatória imposta sobre a animação japonesa veiculada no país? É possível utilizar os próprios animes como forma de romper com o moralismo neopentecostal e conservador?

    Assinado: Vinicius Maciel Braga.

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    1. Muito obrigada, Vinicius!

      Como eu comentei, essa visão já foi rompida. Existem muito mais apreciadores da cultura pop japonesa do que moralistas dispostos a censurar. E a tendência é que esse movimento cresça, dada a renovação das gerações, que tendem a ser mais progressistas.

      Sobre a segunda pergunta: difícil dar uma resposta. O anime teria que ser didático e muito especifíco para isso. Creio que uma estratégia interessante seria normalizar os conteúdos. Netos mostrando para seus avós o que consomem, destacando alguma cena de amor familiar, cenas de amizade... e por aí vai. Pensando nos conservadores, creio que abordar os animes nessa linha familiar seria interessante.

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  3. Pedro Gabriel de Souza e Costa5 de outubro de 2022 às 19:37

    Olá! Parabéns pelo excelente trabalho. Vocês acreditam que a II Guerra é responsável, em parte, pela a cisma com o que vem do Japão? E poderia a fascinação com a cultura deste país ter relação com uma "utopia fantástica" idealizada pela forma como se reconstruíram no pós guerra?

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    1. Essa cisma com o Oriente é muito antiga. Ao longo da história, existem vários exemplos do que falo. Um exemplo mais recente, mas anterior a Segunda Guerra Mundial, seria visto nas ideias dos românticos germânicos, que para criarem uma identidade nacional, tomaram o Oriente como inimigo a ser combatido. É claro, com a guerra todos os antagonismos foram exacerbados.

      Sobre a segunda pergunta, creio que não. Me alinho mais aos argumentos da Mangirón e da Napier. Recomendo as duas leituras, inclusive. São bem elucidativas!

      Luciana de Ávila Freitas

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    2. Pedro Gabriel de Souza e Costa6 de outubro de 2022 às 10:22

      Obrigado pelo retorno e pelas indicações!

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  4. Olá Lucas e Luciana, muito obrigado pelo texto.
    Seria possível afirmar que os animes e mangás seriam sinônimos dos filmes estadunidenses quanto ao exercício de um soft power? Vocês acreditam que a abordagem midiática ocidental dada a pandemia pode ter intensificado o preconceito com obras de origem asiática?

    Assinado: Carlos Germano Gomes Gonçalves.

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    1. Olá, Carlos. Muito obrigado por sua pergunta!
      Sobre a primeira questão, o termo sinônimo não seria o mais adequado, pois devemos analisar as produções dentro de seus contextos de produção. Mas, sim podemos utilizar o termo Soft Power nos dois casos.
      Já sobre a segunda pergunta não poderei afirmar com exatidão. Porém, acredito que tenha alguma influencia em discursos preconceituosos contra países asiáticos. Exemplo foram os diversos ataques, por parte de membros do governo federal, à China, assim como memes em redes sociais que também veiculavam mensagens preconceituosas contra asiáticos.
      Espero ter ajudado, qualquer coisa estou a disposição.
      Assinado: Lucas Marques Vilhena Motta

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  5. Olá, Lucas e Luciana. Primeiramente, gostaria de parabenizar ambos pelo excelente texto. Uma reflexão importante, sobretudo pelo grande papel e influência que os animes, mangás e vídeos games exercem, configurando o conceito de Soft Power que vocês apresentam no texto.
    Como sabemos, o Japão cometeu diversos crimes de guerra, durante os conflitos das décadas de 1930/1940, gerando uma disputa narrativa e de memória no decorrer do século XX, tendo de buscar aceitação pela opinião pública internacional, após o conflito. Um exemplo dessa situação no mercado contemporâneo de mangás, foi o incidente envolvendo o mangaká - Kohei Horikoshi, autor de Boku no Hero Academia, gerando uma série de problemas para a Shueisha.
    Desta forma, esse incidente revela como o ensino de história no Japão, tem algum nível de censura acerca destes temas. Pois, a censura foi muito importante para o esquecimento dos crimes de guerra, e “superação“ deste passado, como é destacado na censura sofrida por Ienaga Saburo e os livros didáticos produzidos por este autor.
    Isto posto, podemos considerar que os mangás, animes e vídeo games, podem contribuir para a construção de uma narrativa e memória coletiva de um Japão, que jamais teria cometidos tais ações?
    Agradeço desde já pela paciência, e agradeço pelo excelente texto, sobre essas mídias que tanto gosto.
    Atenciosamente,
    Edvan Pereira Costa

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    1. Olá, Edvan. Muito obrigado pela pergunta!

      Antes de adentrar na questão em si, gostaria de comentar que eu e a Luciana escrevemos um texto sobre a questão envolvendo o Boku no Hero, caso queira ele esteve presente no simporiente de 2021.

      Sobre a pergunta, irei referenciar a Hashimoto Akiko que escreveu um livro chamado de The Long Defeat. No texto, a autora propões três grandes núcleos narrativos de interpretação da guerra: o primeiro seria o que propõe ver o Japão como vítima, o segundo que interpreta os mortos na guerra como heróis e seus sacrifícios são a base do do progresso no pós-guerra e, por último, seria o reconhecimento dos crimes perpetrados pelo imperialismo nipônico. Dessas três linhas interpretativas, a de reconhecimento dos crimes é a que possui menor representatividade.

      As análises da Hashimoto são em uma escala macro, mas se tratando de obras da cultura popular (como animes, mangás, videogames etc) podemos notar que os discursos são bem variados. Como Philip Seaton, em seu livro Japan´s contested war memories, afirma a ficção é um espaço fecundo para o debate acerca das memórias e traumas da guerra, visto que é um espaço "seguro e sem ligação com a realidade".

      Começando pelos videogames, o trauma influencia toda a indústria no Japão. Jogos de tiro não possuem muito apelo com os consumidores, mas jogos de RPG vendem enormes quantidades. Nos JRPG´s, vemos narrativas com mais nuances quanto a guerra. Exemplo, em Final Fantasy IV temos um protagonista, assombrado pelos crimes de guerra que cometeu, em busca de redenção. Ou na franquia Suikoden (baseada, livremente, no romance chinês Shuihu Zhuan) que debate a guerra dentro de um ambiente de fantasia medieval, mas com referências a crimes de guerra e armas de destruição em massa. Sendo essas narrativas bem complexas, pois conseguem relacionar todas as três estruturas propostas por Hashimoto, ainda que sem referenciar diretamente o passado japonês.

      Já com animes e mangás a tônica segue a mesma, tendo uma grande variação. Desde mangás com discursos pró imperialismo japonês, como Shingeki no Kyojin, até críticas abertas ao imperialismo nipônico como na série Ginga Eiyuu Densetsu, ou obras mais ambivalentes como Uchuu Senkan Yamato.

      Em suma, as obras da cultura popular japonesa podem contribuir para a formação de imaginários acerca da guerra, mas não de uma maneira uniforme.

      Espero ter conseguido te responder, mas reconheço que é uma discussão muito complexa. No mais, fico a disposição.

      Assinado: Lucas Marques Vilhena Motta

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  6. Olá Lucas e Luciana, quero agradecer, primeiramente, pelo excelente texto. Vocês acreditam que essa visão negativa sobre obras japonesas vêm diminuindo, principalmente na geração entre os anos 70, com a facilidade de acesso a alguns desses conteúdos (principalmente séries e filmes) através dos streamings?

    Atenciosamente, Gabriella Onofre

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