Este
trabalho apresenta de modo sintético, como as irmandades cossacas ucranianas,
durante o Medievo e a Idade Moderna defenderam a Europa das agressões do
Império Turco-Otomano. Estrutura-se em dois tópicos, Ucrânia: da Pré-História
ao Medievo e, Os cossacos, respectivamente. Figuram entre as referências
bibliográficas autores consolidados na temática da história da Ucrânia como
Sasse [2007], Skrypnyk [1966], Subtelny [2009] e Yekelchyk [2007], além de
Quataert [2008] para subsidiar a discussão sobre o Império Otomano, entre
outras obras que dialogam e complementam o assunto.
Ucrânia:
da Pré-História ao Medievo
O
estabelecimento de seres humanos onde atualmente é o território da Ucrânia
assemelha-se com a história de outros povos e nações. Registros arqueológicos
de aproximadamente 700 mil anos antes de Cristo, marcam a presença dessa
existência na região; durante o Alto Paleolítico – 40.000 a 15.000 a.C. –
tribos primitivas de caçadores coletores habitavam o norte do Mar Negro
[YEKELCHYK, 2007]. E, por volta de 5.000 anos da mesma era, devido ao
aprendizado da prática da agricultura, sedentarizaram-se.
Em
seguida, a civilização agrícola primitiva mais conhecida, é a Cultura
Tripiliana [Trypillian]. Datada entre 4.000 a 2.500 a.C., viviam em
grandes povoações e tinha como característica agrícola o uso do arado de
madeira; já possuíam também uma vida espiritual desenvolvida, segundo achados
arqueológicos de cerâmicas ornamentadas [YEKELCHYK, 2007]. Apesar da
importância desses registros históricos, existe uma cisão entre estudiosos – os
que defendem e os que não – dessa cultura como os ancestrais dos ucranianos.
Posteriormente,
foi o palco dos cimérios – 1.500 a 750 a.C. – vindos da Ásia Central e que
devido ao seu estilo de vida de montaria nômade, difundiram o uso do cavalo e
das ferramentas de ferro na região [YEKELCHYK, 2007]. Essa presença equina em
solo ucraniano marcaria durante séculos o modus operandi do povo que por
ali se desenvolveria. Logo, os citas substituíram os cimérios e fundaram novas
povoações.
Com
o crescimento das civilizações, em especial na costa do Mar Negro, surgiram
postos comerciais gregos que comercializavam com os citas. E foram eles que
detiveram em 513 a.C., a invasão do rei persa Dario I. Depois, expandiram seus
domínios para o Oeste, até serem detidos pelo rei Filipe II da Macedônia em 339
a.C. Nesse interim, sármatas do Leste assimilaram os citas e se apoderaram de
seu império; entretanto, aqueles que viviam na região da Crimeia resistiram até
200 d.C. [YEKELCHYK, 2007].
No
milênio seguinte, godos, de origem tribal germânica investiram sobre os
sármatas. E novas invasões do Leste também ocorreram: eram os povos turcos –
hunos no século IV, búlgaros e ávaros no VI e cazares no VII [YEKELCHYK, 2007].
Os cazares dominaram a região norte do Mar Negro e as Montanhas do Cáucaso por
aproximadamente dois séculos. Esta presença proporcionou um ambiente seguro
para o desenvolvimento dos povos eslavos orientais, enquanto, ao mesmo tempo, o
Império Bizantino se consolidava no Mediterrâneo.
Para
Yekelchyk [2007], a presença dos cazares nessa região permitiu que ela servisse
como uma “super estrada” comercial e cultural, entre Europa, Ásia e Oriente
Médio, influenciando, inclusive, a Grande Rota da Seda da China. E outro
elemento de destaque estava na fertilidade de seu solo, motivo de cobiça por
todos que habitavam além das suas fronteiras [BURKO, 1963]. Controlar todas
estas características trazia benesses e problemas.
Enquanto
isso, nos limites atuais do centro-leste da Polônia e noroeste da Ucrânia,
exatamente nas Montanhas dos Cárpatos, acredita-se que viviam os povos eslavos
originais, nativos da Europa Oriental que seriam os verdadeiros ancestrais dos
ucranianos, bielo-russos e russos [YEKELCHYK, 2007]. Apesar de não existir unanimidade
entre os historiadores sobre isso, registros arqueológicos do século V apontam
eslavos na Ucrânia, e mostram que houve uma intensificação de seus domínios até
a área central no século VII.
À
medida que os cazares expandiam seu poder sobre a região Eurasiana, os eslavos
se estabeleciam em maior intensidade no Vale do Dnipro, até serem obrigados a
pagar tributos àqueles. Valendo-se de crises internas dos cazares e outras
invasões externas, surge a presença massiva dos vikings na Ucrânia. Nasciam os
contornos étnicos atuais de ucranianos, russos e bielo-russos com a implantação
do Estado da Rus de Kyiv [BURKO, 1963].
O
Estado Kyivano, liderado pelos vikinks, governou e unificou as tribos eslavas
através da diplomacia e da força. A dominação, nem sempre pacífica, demonstrou
seu poder ao repelir em 907 um ataque dos cazares, depois disso, houve o
estabelecimento do comércio com o Império Bizantino. Em 988 – Volodymyr, o
Grande – aceita o Cristianismo bizantino e o implanta em seu império. A proximidade
comercial favoreceu a adoção de uma nova religião à Rus de Kyiv, antes
predominantemente pagã [YEKELCHYK, 2007].
Principalmente
sob o pretexto religioso – Volodymyr, o Grande – expandiu seus domínios para o
oeste da atual Ucrânia e leste da Lituânia e casou-se com a irmã do imperador
bizantino. Após a sua morte, algumas disputas internas entre familiares e
invasões estrangeiras marcaram o Estado Kyivano. Seu filho – Yaroslav, o Sábio
– reconquistou o poder ao se casar com a filha do rei sueco; fruto desse
casamento, em pouco tempo tinha como genros os governantes da França, Noruega e
Hungria [YEKELCHYK, 2007].
Embora
a família tenha se tornado extremamente articulada e poderosa, fora ela mesma
que atrapalhou a expansão do poder kyivano sobre o restante da Europa. Como as
sucessões seguiam uma sequência diferente de outros reinados [não utilizando a
primogenitura], a Rus de Kyiv se fragmentou em vários principados e feudos nas
décadas seguintes [YEKELCHYK, 2007]; mesmo durante o reinado de Volodymyr II –
1113 a 1125 – que conseguiu certa autoridade política e florescimento cultural
num cenário de decadência territorial.
Um
fato histórico deste período que merece destaque e se consagra como a primeira
agressão russa contra os ucranianos é o ataque do príncipe Andrei Bogoliubskii
em 1169 contra a Rus Kyivana. A invasão contou com saques, pilhagens e
incêndios em Kyiv, acabando com sua hegemonia enquanto centro político daquela
região. Vale ressaltar que neste momento histórico, o príncipe não estava motivado
por questões étnicas ainda, mas buscando restaurar as possessões de seu avô,
Volodymyr II [YEKELCHYK, 2007].
Entre
1237 e 1240, os mongóis dominaram a Rus. Devido a vasta extensão de seu império
e autoridade sobre inúmeros povos, entre eles algumas tribos turcas, ao
chegarem até os eslavos orientais ficaram conhecidos como tártaros. Os mongóis
sob as ordens do neto de Ghengis Khan – Batu Khan – cobravam impostos sobre a
população, mas não interferiam muito no cotidiano das cidades [YEKELCHYK,
2007].
Enquanto
isso, emergem três novos principados que derivaram politicamente de Kyiv:
Galícia-Volínia [atual oeste da Ucrânia] em 1238, Vladimir Suzdal [parte
europeia da Rússia, que posteriormente se chamaria Moscóvia] e Novgorod [norte
russo]. Não muito tempo depois, como resultado da ingerência e novas invasões
da Horda Mongol, o reino da Galícia é anexado ao da Polônia em 1378 e a Volínia
ao da Lituânia [SEGRILLO, 2012]. É deste período que aqueles que viviam
próximos a Kyiv passaram a ser chamados de rutenos
[русини – rusyny – derivado de Rus] e os que viviam na atual Rússia, de
moscovitas [SUBTELNY, 2009].
Os
cossacos
Se
o território ucraniano estava dominado por diferentes grupos étnicos no final
da Idade Média, é preciso destacar que ao sul, surgia um novo inimigo: os
tártaros. Para Yekelchyk [2007] os tártaros eram originalmente o povo turco que
constituía o exército mongol no século XIII. Mas, os que viviam na Crimeia no
final do século XV após a ocupação da Rus haviam se separado do enfraquecido Império
Mongol.
Os
tártaros da Crimeia tornaram-se vassalos do Império Otomano. Entre os anos de
1300 e 1683, tal estado partiu de um pequeno feudo para encontrar seu máximo
esplendor. Nesse período, os otomanos dominavam da Península Arábica e das
cataratas do Rio Nilo ao sul e, da região de Baçorá, no Golfo Pérsico até o
Planalto Iraniano a oriente; a oeste quase até Gibraltar e claro, ao norte, até
as estepes ucranianas [QUATAERT, 2008], lar dos cossacos. Sua presença
compreendia também os mares Negro, Egeu, Cáspio, Vermelho e Mediterrâneo.
A
partir do ano 1480, eles partiam das suas terras e invadiam e devastavam os
territórios da atual Ucrânia. Além de alimentos, ferramentas e animais, outro
objetivo desses assaltos era a obtenção de escravos para serem vendidos no
Porto de Kaffa na Crimeia [SUBTELNY, 2009]. As consequências desses ataques
inviabilizavam a vida por décadas, como se percebe no trecho:
“Por
exemplo, de 1450 a 1586, oitenta e seis ataques foram registrados, e de 1600 a
1647, setenta. Embora as estimativas do número de cativos capturados em um
único ataque tenham atingido até 30.000, a média foi mais próxima de 3.000. De
qualquer forma, as perdas para os ucranianos eram sérias. Só em Podília, cerca
de um terço de todas as aldeias foram devastadas ou abandonadas entre 1578 e
1583” [SUBTELNY, 2009, p. 106, tradução nossa].
Não
obstante os ucranianos serem assaltados pelos tártaros ao sul, sob o jugo dos
impérios polaco-lituano pelo norte e oeste, logo se depararam com diversos
problemas sociais que faziam a vida ficar praticamente insustentável. Além das
diferenças culturais com seus senhores, contrastava a questão religiosa: os
poloneses eram católicos, enquanto os ucranianos, ortodoxos. Falta de terras,
abuso de poder, preconceito e a servidão, logo passaram a alimentar um
sentimento contrário às autoridades.
E
aqueles que haviam fugido dessas mesmas condições para o leste, encontraram
certa prosperidade. Apesar das invasões estrangeiras, existia liberdade e
trabalho. Para Subtelny [2009] ainda que esses ucranianos tivessem que muitas
vezes arar suas terras com a espada empunhada, foram mais autossuficientes e
ousados, desenvolvendo habilidades militares que seus compatriotas de outras
localidades não tinham. E, após duas gerações, seus filhos nunca haviam ouvido
falar em servidão, e isso fez com que alimentassem a ideia de serem homens
livres, sem dever obrigações a nenhum outro.
Como
resultado desses contrastes, no sul das estepes ucranianas no século XV,
começaram a formar grupos de pescadores, caçadores e até de saqueadores, entre
eles, camponeses fugitivos da servidão que passaram a ser chamados de cossacos
[козаки – kozaquê] [YEKELCHYK, 2007]. A origem da palavra remonta a palavra
turca “kazak”, cujo significado é homem livre. Em seus primórdios, mulheres
também faziam parte, logo, isso foi proibido e punível com a morte [OPANOVIC,
1966].
Geralmente
utilizavam armas brancas e de fogo; como espadas, lanças, mosquetes, balestras
e foguetes incendiários; machados, foices, pás e cordas complementavam as
ferramentas [OPANOVIC, 1966]. Tais instrumentos demonstravam que o trabalho
existia tanto em tempos de paz, quanto de guerra. Outra característica
marcante, era a bravura. O historiador turco Mustafa Naima escreveu sobre eles:
“Reconhece-se
abertamente que no mundo inteiro não se pode encontrar um povo mais corajoso.
Eles não demonstram o menor medo de perder a vida, e ainda, muito menos da
morte” [OPANOVIC, 1966, p. 16, tradução nossa].
Admitindo
a importância bélica dos cossacos, ainda no XV, o Papa Inocêncio XI, escreveu
para eles, articulando uma aliança em defesa da Europa Cristã, contra as
investidas turco-otomanas [BURKO, 1963]. Além de apoio moral e religioso, 3 mil
soldados cossacos deveriam receber subsídios financeiros e lutar sob as
insígnias pontifícias. E a época, a Igreja Católica declarou através do Núncio
Apostólico de Varsóvia: “os cossacos devem ser considerados como a melhor
infantaria que possa existir contra os Turcos” [BURKO, 1963, p. 28].
Paralelamente,
o rei da Polônia e o imperador da Áustria planejavam fazer o mesmo, entretanto,
fazê-los lutar por suas bandeiras [BURKO, 1963]. No século XVI, os nobres
poloneses perceberam que poderiam usar essa força militar autônoma conforme
seus caprichos. Contratavam os cossacos para defender as fronteiras de seu
império contra as ofensivas dos tártaros. E, muitas vezes, os cossacos se
aventuravam nas estepes e no Mar Negro onde saqueavam e resgatam cativos
ucranianos. Não demorou para serem reconhecidos como uma força militar que
conquistou seu espaço através da força.
Exemplos
de sua bravura e eficiência foram registrados, muito antes dos cossacos se
organizarem de modo mais sistematizado. Construíram dezenas de barcos esguios
[chamados de чайки – tchaikê] que levavam até sessenta homens e atacaram os
fortes tártaros da Crimeia e otomanos da Turquia, ao longo do Mar Negro já em
1538 [SUBTELNY, 2009]. Não demorou muito
para ficarem conhecidos tanto na Europa, quanto na Ásia.
Embora
fossem considerados os homens livres das estepes ucranianas, havia uma rígida
hierarquia dentro da irmandade cossaca, sendo agrupados em regimentos com
quinhentos e até mil homens [OPANOVIC, 1966]. O poder era exercido por uma
assembleia geral que todos participavam das decisões; a individualidade de cada
guerreiro era enorme, mas subjugava-se a deliberação do grupo. Em momentos de
guerra, o hetman [гетьман], reconhecido como o comandante militar da
comunidade dispunha de poderes ilimitados como ditador [BURKO, 1963].
Com
a construção da fortaleza de Zaporizhia Sich, entre 1552 e 1554, no Rio Dnipro
pelas mãos de um herói, o soldado ortodoxo Dmytro Vyshnevetsky, que conseguiu
unir diversos desses grupos sob seu comando; o Estado Cossaco, passou a ter uma
distinção social diferenciada na Europa. Os reis poloneses, percebendo o poder
que estes homens tinham, concederam-lhes direitos e liberdades que outros não
possuíam e, claro, impuseram limites para o número de cossacos que poderiam
existir [YEKELCHYK, 2007].
Em
1594, o império dos Habsburgos da Áustria, enviou para o Zaporizhia Sich um
representante para negociar com os cossacos um ataque coordenado contra os
otomanos na atual região da Moldávia. Fruto dessa viagem, o diplomata Eric
Lassota Von Steblau, escreveu um livro intitulado “Habsburgos e Cossacos
Zaporizhianos” [1975] em que descreve pormenorizadamente essa relação
[SUBTELNY, 2009].
Difícil
tolerá-los, pior sem eles, eram um mal necessário. Houve três grupos cossacos
distintos durante o século XVII: aqueles que eram contratados pelo reino
polonês, aproximadamente 3 mil homens; os da Zaporizhia; e aqueles que viviam
nas fronteiras, espalhados em diferentes locais com o mesmo estilo de vida;
estes dois últimos grupos totalizavam aproximadamente 50 mil homens [SUBTELNY,
2009]. Houve disputas entre os que trabalhavam para os poloneses, únicos que
possuíam alguns direitos reconhecidos, e os demais, que por vezes, viviam na
extrema pobreza.
Apesar
dos cossacos registrados desfrutarem de certos benefícios perante a elite
polonesa, e isso só devido a necessidade de sua força; os outros, que não
tinham nenhum vínculo estabelecido passaram a ser reconhecidos como necessários
a segurança europeia também. As constantes invasões dos tártaros demonstravam
que apenas 3 mil homens não conseguiam frear as invasões. Não eram vistos como
bandidos ou párias sociais, mas defensores de um território e de um povo,
principalmente depois da destruição otomana na Hungria em 1529 e que quase
capturou Viena [SUBTELNY, 2009].
Organizados,
contratados pelos reinos europeus ou motivados por conta própria, seja na busca
por vingança ou fortuna investiam contra seus inimigos. O próprio Império
Otomano culpava os poloneses de não conseguirem controlar os cossacos, causando
mal-estar entre os reinos:
“As
incursões cossacas contra os otomanos atingiram o ápice entre 1600 e 1620. Em
1606, os cossacos destruíram Varna, a fortaleza otomana mais forte do Mar
Negro; em 1608, Perekop caiu em suas mãos; em 1609, eles saquearam Kilia,
Ismail e Akkerman; em 1614, até então a intocada Trabizonda na Ásia Menor foi
atacada; e em 1615 eles desferiram um golpe mais audacioso quando, à vista do
sultão e uma guarnição de 30 mil homens, cerca de oitenta cossacos num barco
conseguiram entrar no Porto de Constantinopla, queimá-lo e fugir. Em 1620, eles
repetiram a mesma façanha. Enquanto isso, em 1616, Kaffa, o empório comercial
escravocrata da Crimeia, foi tomada e milhares de escravos libertados”
[SUBTELNY, 2009, p. 112, tradução nossa].
E
não eram apenas exímios guerreiros nos mares. Expedições terrestres ágeis e
estratégicas também figuravam como uma marca da atuação cossaca. O sultão
otomano Osman II, enfurecido pela incapacidade de o governo polonês controlar
seus “soldados”, investiu contra, com aproximadamente 160 mil homens, pelotão
este que contava com vários tártaros da Crimeia. Tal fato ficou conhecido como
a Batalha de Cecora, que aniquilou o exército polonês em 1620 [SUBTELNY, 2009].
Entretanto,
em 1621, 35 mil poloneses lutavam na mesma guerra na região de Khotin,
território ucraniano. Se não fosse a chegada de 40 mil cossacos que somaram
forças, mais uma vez, a armada polonesa seria destruída [SUBTELNY, 2009]. O
entrave se estendeu por um mês e resultou na negociação da paz, tendo os dois
lados que ceder às vontades inimigas. Montados em cavalos e empunhando espadas,
enfrentavam sem medo qualquer oponente.
Outras
tantas incursões seguiram exitosas, mas em 1637 os cossacos conquistam o Mar de
Azov [Azak, para os otomanos] [QUATAERT, 2008] e mais uma vez, reafirmaram seu
poder bélico – terrestre e marítimo – perante seus velhos inimigos, que dessa
vez, perdem sob o comando do sultão Murad IV.
Devido
ao seu sucesso nas batalhas e entraves com outros grupos europeus, os cossacos
logo passaram a se enxergar como representantes do Cristianismo ortodoxo,
perante seus senhores católicos e seus inimigos muçulmanos. Também se percebiam
como defensores do seu povo no quesito étnico, pois os ucranianos viviam sob o
jugo da servidão e como se não bastasse, das ofensivas tártaras/otomanas.
Questões externas e internas alimentavam a motivação dos cossacos [SUBTELNY,
2009].
Considerações
Se
para Sasse [2007] a Ucrânia foi o palco onde se efetivou de diferentes formas a
articulação entre os impérios Habsburgo, Russo e Otomano enquanto atores
externos, desprende-se disso de que, certamente, no mesmo cenário um dos principais
protagonistas internos foram os cossacos. Não obstante em sua história terem
deslocado sua concepção de inimigo, reconhecendo como tais ora poloneses, ora
tártaros e turco-otomanos [BURKO, 1963], sua presença foi essencial em diversas
batalhas para deter invasões estrangeiras.
Em
tempos de paz, mercenários; em tempos de beligerância, essenciais. Sua estima,
ou a falta dela, um dilema: relacionava-se conforme convinha para os
governantes, em especial, para os poloneses. Reconhecidos como os homens da
fronteira, assim a zelavam dos forasteiros enquanto seguiam suas vidas. Para
Opanovic [1966] foram os responsáveis por trazer de volta a vida nas estepes
ucranianas; a atuação dos cossacos, seja como homens da lei ou fora dela,
ultrapassa os limites impostos neste trabalho e não se limita apenas na luta
contra os tártaros ou o próprio Império Otomano. Eles participaram de inúmeras
outras batalhas, que até alcançaram a contemporaneidade.
Referências
Talita
Seniuk é licenciada em História pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, em
Ciências Sociais pela Universidade Metodista de São Paulo e em Filosofia pela
Universidade Metropolitana de Santos; pós-graduada em Metodologia do Ensino de
História e Geografia pelo Centro Universitário de Maringá e em Ensino de
Sociologia pela Universidade Cândido Mendes. Coautora do livro As Ucrânias do
Brasil: 130 anos de cultura e tradição ucraniana pela Editora Máquina de
Escrever. Atualmente é pesquisadora integrante do Grupo de Pesquisa CNPq em
Mídias, Tecnologias e História [MITECHIS] da Universidade Federal do Tocantins;
Professora de História, Sociologia e Filosofia da Secretaria de Estado de
Educação de Mato Grosso; colunista do Jornal Ucraniano Pracia - Праця e
colaboradora do Blog Exílio-migração política |humanidades digitais.
BURKO,
Valdomiro. A Imigração Ucraniana no
Brasil. Curitiba: [s. n.], 1963. [Livro]
LASSOTA
VON STEBLAU, Erich. Habsburgs and
Zaporizhian Cossacks: the diary of Erich Lassota von Steblau 1594.
[translated by Orest Subtelny]. Colorado: Ukrainian Academic Press, 1975.
[Livro]
OPANOVIC,
Olena. The Cossack Republic. In: SKRYPNYK, Mary. Folk heroes of Ukraine. Toronto: The Ukrainian Canadian Press,
1966. [Livro]
QUATAERT,
Donald. O Império Otomano: das origens
ao século XX. Coimbra: Edições 70, 2008. [Livro]
SASSE,
Gwendolyn. The Crimea question:
identity, transition, and conflict. Cambridge: Harvard University Press,
2007. [Livro]
SEGRILLO,
Angelo. Os Russos. São Paulo:
Contexto, 2012. [Livro]
SUBTELNY,
Orest. Ukraine: a history. Toronto:
University of Toronto Press, 2009. [Livro]
YEKELCHYK,
Serhy. Ukraine: Birth of a Modern
Nation. New York: Oxford University Press, 2007. [Livro]
TALITA: De imediato posso afirmar que fiquei extremamente surpreso pela a História desse grupo de bravos guerreiros e ver a trajetória dos cossacos na Ucrânia e regiões. Parece de certa forma que a Ucrânia tem adotado uma espécie de "espirito cossaco contra os Russos no conflito que se arrasta entre Russia e UCRÂNIA. Eu sou da região do Sul do Paraná mais precisamente de São Mateus do Sul e já vi algumas apresentações culturais Ucranianas em União da Vitória, e percebi algumas danças que remete a Guerreiros da Ucrânia. Seriam essas danças tipicas algumas representações dos cossacos?.
ResponderExcluirATENCIOSAMENTE. ELOIS ALEXANDRE DE PAULA
Olá, Elois.
ExcluirObrigada pelo interesse na temática e pela pergunta!
Algumas dessas danças, como você afirma, são sim, representações dos cossacos ucranianos. São guerreiros exímios há tempos e ainda hoje, lutam pela nação. Existem diversos referenciais sobre eles, pena que a maioria ainda, em língua estrangeira. Também sou do Paraná, onde a presença da cultura ucraniana é bastante forte. Caso queira, podemos trocar ideias sobre a temática, através do email talitaseniuk@gmail.com
Espero ter contribuído com a temática.
Obrigada, Talita Seniuk.
obrigado Talita
ExcluirBoa noite, primeiramente gostaria de parabenizar a autora pela excelente pesquisa, quando li o trabalho me veio um questionamento em torno da expansão otomana no leste europeu e os cossacos ucranianos, quando os otomanos anexaram territórios historicamente pertencentes aos cossacos houve sua integração ao império (incluindo em ordem militares)? Ou foram mantidos como povos dominados, comandados por estrangeiros? houve relação entre cossacos e otomanos além dos conflitos militares?(LUANA DE OLIVEIRA MATIAS)
ResponderExcluirOlá, Luana.
ExcluirObrigada pelo interesse no assunto e pelos questionamentos.
Em relação as perguntas, considerando meu conhecimento sobre os cossacos, afirmo que eles não se integravam ao império turcomano quando estes estavam de posse de um território que anteriormente pertencia à eles; certamente os regimentos recuavam para dentro das estepes europeias e depois de um tempo, empreitavam nova investida militar para recuperar aquilo que haviam perdido. Claro que as famílias que já estavam instaladas nessas regiões de beligerância, na maioria das vezes, apenas trocavam de senhores; pois toda sua vida estava presa à propriedade em questão. E como no caso dos regimentos cossacos serem compostos apenas por homens, que até possuíam pequenas propriedades, eles valorizavam essa liberdade característica do grupo e se agrupavam em regiões específicas, onde havia seus acampamentos, como foi o caso de Zaporizia. E ainda, outro fator que reforça essa questão era a identidade religiosa, que contrastava entre esses dois grupos, que se viam, por este viés, como inimigos mortais.
Entretanto, imagino que dever ter ocorrido diversas interações entre os povoados que ficavam nessa fronteira, que era o palco das guerras entre cossacos e turcomanos, principalmente por aqueles que não participavam diretamente do conflito, até por uma questão de sobrevivência. Mas desconheço um exemplo agora para citar.
Caso queira, podemos trocar ideias sobre a temática, através do email talitaseniuk@gmail.com
Espero ter contribuído com a temática.
Obrigada, Talita Seniuk.